Agropecuária

Proibição de exportação de gado vivo “fere liberdade religiosa”

Foto: DM Aguiar/Embrapa/Divulgacão

Embora não esteja em vigor, a sentença que proíbe as exportações brasileiras de gado vivo provocou reações entre representantes da pecuária. A avaliação é que a decisão do juiz Djalma Moreira Gomes, da 25ª Vara Cível Federal de São Paulo, mostra desconhecimento sobre o cumprimento de normas rigorosas pelos exportadores, seja em relação a aspectos sanitários ou a bem-estar animal, e sobre a importância socioeconômica da cadeia produtiva. Além disso, pontuam, a determinação interfere em questões culturais e religiosas de outros países.

Para o ex-ministro da Agricultura e Pecuária Marcos Montes, foi “uma decisão muito infeliz” tomada pelo juiz. “O Brasil tem hoje um dos serviços de sanidade mais apurados e respeitados do mundo. O Brasil é referência lá fora por várias ações, mas principalmente pela sua sanidade. E o Mapa é extremamente exigente para exportação de boi em pé.”

Marcos Montes entende que uma sentença judicial não pode ameaçar uma cadeia produtiva que tem importância socioeconômica para o país. “Então, não pode uma decisão de um juiz [proibir as exportações de gado vivo]. Com todo o respeito, mas ele não conhece o assunto e não sabe o trabalho que foi feito para que passássemos a ser um grande exportador de boi em pé, ocupando o espaço de grandes países, como a Austrália.

Ex-ministro da Agricultura Marcos Montes – Foto: Mapa/Divulgação

O ex-ministro lembra ainda que o reconhecimento da qualidade e sanidade do rebanho brasileiro pode abrir novos mercados, como o da Indonésia, que está negociando com o Brasil a assinatura de certificado zoossanitário internacional para liberar os embarques.

A exportações de gado vivo, acrescenta o ex-ministro, são “uma derivação da atividade do pecuarista, que hoje sofre com os preços [baixos] e busca alternativas. Essa é uma decisão que desconhece a vigilância severa do Mapa em relação ao bem-estar animal. Espero que a sentença seja revista para que os produtores sigam trabalhando.”

Nicho de mercado importante

Vice-presidente da Associação dos Criadores do Pará (Acripará), Maurício Fraga reforça que há normas sanitárias e de bem-estar animal para transporte terrestre, aéreo e marítimo de gado vivo. “Se essas regras são cumpridas, não há motivo para acabar com a exportação. Além disso, esse é um nicho de mercado importante para o Pará, ajudando, inclusive, a balizar os preços.”

Fraga destaca que os compradores de bovinos vivos não querem importar carne. “Se o Brasil não vender boi vivo para esses mercados, eles compram do Uruguai, da Colômbia e de outros países. Então, o ideal para o Brasil é atender todos os mercados: o da carne e do gado vivo.”

Maurício Fraga, vice-presidente da Acripará – Foto: Divulgação

O dirigente da Acripará ressalta ainda que as vendas externas de boi vivo mostram a confiança internacional no sistema de defesa agropecuária brasileiro. “Por isso, não vejo justificativa para entregar mercados aos nossos concorrentes.”

Desenvolve Pecuária

O Instituto Desenvolve Pecuária também se posicionou sobre a decisão do juiz, frisando que ela ignora a liberdade religiosa. “Quando invadimos a questão cultural de abates de animais, é muito delicado. Existem religiões que fazem o abate de animais e isso é permitido no Brasil por lei de livre crença.”

“A sentença teria se baseado em um suposto caso de maus tratos aos animais em um navio no Porto de Santos. O autor [da ação] fez o pedido de suspensão das exportações de um carregamento que seria destinado a um país muçulmano, conhecido por realizar o abate Halal, no qual animal precisa estar saudável e não pode ser atordoado na hora do abate.”

O presidente do Desenvolve Pecuária, Luís Felipe Barros, afirma que “não podemos suspender uma ferramenta econômica, como a exportação de gado, por causa da ideologia cultural de um juiz, que entende que os muçulmanos maltratam os animais a partir do modo que a sua cultura diz como deve ser abatido um animal.”

Barros salienta que os autores juntaram apenas fotos como provas. “O juiz deferiu o pedido de liminar suspendendo as exportações com base nessa suposta crueldade, determinando que os países de destino tivessem procedimentos onde se pudesse auditar que eles estavam comprometidos com o bem-estar animal. Ou seja, ele delega a um terceiro país que se fizesse esse controle.”

Luís Felipe Barros, presidente do Instituto Desenvolve Pecuária – Foto: Divulgação

O dirigente do instituto questiona o alcance da sentença. “Temos um juiz de primeiro grau delegando a nações estrangeiras que tivessem uma normativa para que ele possa liberar a exportação do Brasil, desconsiderando todas as normativas do Ministério da Agricultura sobre o tema.”

A União, recorda Barros, já conseguiu reverter essa decisão. “O tribunal foi claro ao dizer que ao juiz compete julgar a lei. E a lei e as resoluções sobre o regramento do Ministério da Agricultura foram todas cumpridos, obedecendo uma legislação extremamente rígida”.

“Existe crueldade? Não. Maus tratos? Não. Foi violada alguma normativa do Ministério da Agricultura? Não. Foi violada alguma lei? Não. Isso não consta na sentença. Absolutamente isso não entra na sentença, e o juiz deveria dizer se a lei foi violada ou não e isso não é dito.”

De acordo com Barros, o juiz suspendeu “toda a exportação de um país com base em um caso e em um parecer de uma perita municipal que não aponta violação de nenhuma regra.”

Em seu despacho, o magistrado informa que a sentença da ação ajuizada por uma ONG de proteção animal não entrará em vigor até que o seu   mérito seja apreciado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3).

Pecuaristas e o bem-estar animal

Barros argumenta que “não há lógica alguma em pensar que pecuaristas e exportadores defendam práticas que não considerem o bem-estar. “Nenhum pecuarista é a favor de maus tratos aos animais. Pelo contrário: bem-estar animal traz melhores resultados.”

“Não somos contra a sentença porque não queremos o bem-estar animal. Nós queremos que as coisas sejam justas e que o julgamento seja de acordo com as provas do processo”, esclarece o presidente do Desenvolve Pecuária. “Por que maltrataríamos os animais, se quem perde financeiramente somos nós, os donos do gado, e os proprietários do navio?”

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One thought on “Proibição de exportação de gado vivo “fere liberdade religiosa”

  • O Halal busca o abate sem sofrimento. Precisam apresentar o Google pra esse senhor.

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