Pecuaristas esperam revisão de sentença que proíbe exportação de gado vivo

Da redação//AGROemDIA
Uma decisão judicial pode excluir o Brasil do comércio mundial de bovinos vivos. Ao julgar ação ajuizada contra a União por uma ONG de proteção animal, o juiz Djalma Moreira Gomes, da 25ª Vara Cível Federal de São Paulo, proibiu a exportação de animais vivos no país. Entretanto, a sentença não vai vigorar até que o seu mérito seja apreciado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3). Na prática, os embarques de gado vivo seguem liberados. Mesmo assim, a determinação preocupa os exportadores, que esperam que ela seja revista.
Na avaliação do setor, a decisão parece desconsiderar que o Brasil é signatário do Código Sanitário para Animais Terrestres da Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA), reconhecida pela Organização Mundial do Comércio (OMC) como responsável pelas diretrizes de questões sanitárias e de bem-estar animal, e que o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) estabeleceu, anos atrás, o “Regulamento técnico para exportação de bovinos, bubalinos, ovinos e caprinos vivos, destinados ao abate ou à reprodução”.
Tanto o código da OMSA quanto o regulamento do Mapa exigem dos exportadores o cumprimento de uma série de normas sanitárias e de bem-estar para o transporte dos bovinos até o país de destino. Entre elas, procedimentos de preparação dos animais vivos, seleção de estabelecimentos de origem, aprovação de estabelecimentos de pré-embarque (EPE) e manejo dos animais nas EPEs e durante o embarque via marítima, terrestre e aérea.
Em documento enviado à Advocacia Geral da União (AGU) para subsidiar a defesa do Estado brasileiro na ação civil pública ajuizada pelo Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, em 2017, o Mapa informa: “Todas as exportações de animais, inclusive bovinos, são fiscalizadas por auditores fiscais federais agropecuários do ministério, possuidores de formação em medicina veterinária, que têm a atribuição de verificar a aplicação dessas normas pelo segmento exportador de gado.”

Fiscalização e quarentena
O Mapa esclarece ainda: “A fiscalização é feita em estabelecimentos aprovados para quarentenas e é acompanhado o carregamento dos animais nos pontos de egresso por qualquer modalidade (marítima, rodoviária e aérea).” Segundo o ministério, o objetivo é garantir que os animais destinados à exportação sejam transportados em bom estado de saúde, procedam de estabelecimentos e áreas sem risco de doenças e atendem aos requisitos sanitários dos importadores.
O ministério acrescenta que auditores fiscais federais agropecuários do Vigiagro (Vigilância Agropecuária Internacional) verificam nos portos se as condições sanitárias e físicas dos animais se mantiveram durante o trajeto rodoviário das propriedades até o local de embarque. “Quanto ao bem-estar, averígua-se se o navio possui condições de alojar os animais, o manejo empregado no embarque, a capacidade de suprimento de ração, água, medicamentos e se há presença de veterinários responsáveis no acompanhamento de viagem.”
Ainda de acordo com o Ministério da Agricultura, os navios que transportam bovinos não operam apenas no Brasil, mas fazem viagens transcontinentais prestando serviço de transporte de cargas vivas também para outros países. “A peculiaridade dessa atividade obriga que essas embarcações marítimas atendam a rígidos protocolos internacionais para que os animais sejam transportados de forma segura e desembarcados em boas condições físicas e plena saúde.”
No documento encaminhado a AGU, o Mapa sublinha que uma eventual proibição das exportações de gado vivo tem potencial de arranhar o conceito conquistado mundialmente pelo serviço veterinário brasileiro, o que poderia ter impacto negativo sobre outras cadeias produtivas do agronegócio. Isso porque os embarques de boi vivo impulsionam as vendas externas de outros produtos bovinos, como carne, derivados, subprodutos e material genético (sêmen e embriões).
Atestado de qualidade e sanidade
“As vendas externas de bovinos vivos são um atestado da qualidade e da sanidade do nosso rebanho”, ressalta um representante do setor. Segundo ele, poucas atividades são tão fiscalizadas quanto as exportações de bois vivos por via marítima. “Mesmo que não seja contra os exportadores, mas contra a exportação de boi vivo, a ação ajuizada pela ONG de proteção animal”, diz essa fonte, quer criminalizar uma cadeia produtiva que cumpre com todas as normas técnicas e desgastar a imagem do agro brasileiro. Certamente, nossos concorrentes agradecem.”
O setor enfatiza ainda que proibição das vendas externas de gado vivo pode prejudicar toda a pecuária. No ano passado, as exportações de bovinos vivos representaram uma receita de US$ US$ 192,3 milhões, tendo como principais destinos Iraque, Jordânia, Turquia, Arábia Saudita, Egito, Líbano e Emirados Árabes. “Os empregos gerados pela cadeia produtiva, especialmente no Norte, Sul e Centro-Oeste do país, estão ameaçados, assim como a geração de renda.”
A exportação de gado vivo é um nicho de mercado exigente, restrito e muito disputado que movimenta cerca de 5 milhões de cabeças/ano e cujo maior importador são dos Estados Unidos. O Brasil só conseguiu entrar no seleto grupo de exportadores com a erradicação de doenças transfronteiriças, como a febre aftosa. “A cadeia produtiva começou a se estruturar no Brasil em 2004. Deste então, sublinha o Mapa, “as exportações brasileiras de bovinos tem contribuído com a elevação do PIB [Produto Interno Bruto] nacional.”

Dever jurídico e preceito moral
O juiz Djalma Moreira Gomes entende, no entanto, que esse tipo de comércio desrespeita o bem-estar dos bovinos. Na decisão, ele sublinha que os animais não humanos são sujeitos de direito e a proteção deles é um dever jurídico, não apenas um preceito de ordem moral. “Os animais não são coisas. São seres vivos sencientes, isto é, indivíduos que sentem fome, sede, dor, frio, angústia, medo. Por isso, a evolução da civilização fez com que os animais deixassem de ser tão somente objetos de direito e passassem a ser sujeitos de direito.”
Os representantes da cadeia produtiva dizem não discordar do magistrado. “Tanto que atendemos todas as exigências legais para embarcar os animas em perfeitas condições sanitárias e de bem-estar para os países importadores. Afinal, ninguém compra um boi doente ou maltratado. Agora, é inaceitável que tentem inviabilizar uma atividade que gera emprego e renda. Esperamos que o Tribunal Regional Federal da 3ª Região reveja a sentença e mantenha as exportações brasileiros de gado vivo.”
Eles lamentam ainda que o juiz Djalma Moreira Gomes não tenha permitido que participassem da ação como amicus curiae, ou seja, como parte interessada, para que pudessem dar esclarecimentos sobre os procedimentos adotados no embarque de bovinos vivos para os países que buscam o Brasil para importá-los.
Em fevereiro de 2018, a magistrado havia concedido liminar suspendendo a exportação de animais vivos em todo o Brasil. Porém, a União recorreu ao TRF-3, e a desembargadora Cecília Marcondes cassou a liminar até o trânsito em julgado da ação civil pública. Por isso, Djalma Moreira Gomes decidiu agora que a sentença só pode vigorar depois do julgamento do TRF-3.

