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Respeito à cultura rural

Gil Reis*

Uma das fontes importantes do Direito é o ‘consuetudinário’, relativo aos hábitos e costumes de um povo ou sociedade, segundo o Diciodicionário online de português. Os costumes de um povo ou sociedade norteiam as primeiras regras da vida humana. Por isso, diante de qualquer regramento ou atitudes, é preciso observar quais são os costumes de um povo. Tal comportamento tem sido muito pouco observado em nosso país, notadamente no mundo rural, onde os regramentos, até punições, ocorrem em total desrespeito às tradições e cultura históricas na produção rural.

Algumas autoridades, ativistas ambientais, ONGs internacionais, juntamente com seus colaboracionistas e políticos no Brasil, com total desconhecimento do nosso mundo rural e como funciona a produção de alimentos, elaboram e propõem regramentos em total desrespeito às tradições e cultura dos produtores rurais.  Eles chegam ao cúmulo de denunciar e punir os povos originários pelo costume milenar das queimadas, como um dos processos da produção de alimentos, transformando-as em enormes escândalos nacionais e internacionais, além de usá-las como arma política.

É um procedimento típico provocado pelo ambientalismo importado para impedir o nosso desenvolvimento. Felizmente esse tipo de desrespeito utilizado contra os países em desenvolvimento não é seguido em outras partes do mundo. Recentemente, um país do ‘velho mundo’, a Espanha, deu exemplo de respeito à cultura e tradição do mundo rural. O fato foi relatado pela agência de notícias Reuters, no último dia 23 de outubro, em reportagem intitulada “Ovelhas tomam conta das ruas de Madri, enquanto se dirigem para pastagens de inverno.” Reproduzo:

“Ovelhas substituíram carros nas ruas de Madri neste domingo, enquanto pastores seguindo antigas rotas de pastoreio conduziam seus rebanhos pelo centro da capital espanhola para pastagens ao sul para pastar no inverno. Moradores e turistas se enfileiraram na rota e observaram milhares de ovelhas caminharem pela cidade, os sinos em volta do pescoço proporcionando uma trilha sonora barulhenta.

O evento anual foi revivido em 1994 como parte da Fiesta de la Trashumancia anual de Madri, depois que o parlamento espanhol reconheceu as rotas tradicionais que os pastores usavam para pastorear seu gado. Apenas alguns séculos atrás, a rota os levaria por campos tranquilos, mas hoje os vê atravessar algumas das áreas mais movimentadas da cidade, incluindo a Plaza Mayor, a praça principal de Madri. Os espectadores tiraram fotos e vídeos em seus telefones, enquanto algumas crianças estenderam as mãos para acariciar as ovelhas.

Muitas pessoas ficaram surpresas com a visão inesperada em uma cidade geralmente lotada de tráfego. ‘Foi uma loucura. Havia tantas ovelhas. Nunca vi nada parecido. Foi uma ótima maneira de aprender sobre a história e a cultura espanholas’, desse a professora de inglês Maria Kouriabalis, uma americana de 22 anos que mora em Madri.”

Como articulista que acompanha todas as perseguições contra o nosso mundo rural, sob os mais diversos pretextos, a primeira pergunta que me vem à mente é: Onde estão os ativistas mundiais do bem-estar animal, cujas ações são copiadas pelos ativistas nacionais? Dormindo ou toda a campanha sobre o assunto se prende apenas à pecuária brasileira?

Vamos imaginar, limitando aos bovinos e ovinos, bois e ovelhas desfilando em direção a algum pasto tradicional pelas ruas da poderosa megalópole São Paulo. Qual seria a reação das autoridades, ativistas ambientais, ONGs internacionais juntamente com seus colaboracionistas e políticos? Tenho absoluta certeza de que as reações seriam imensas e contrárias a tal fato. Não é possível que alguém imagine que as nossas cidades não nasceram a partir de propriedades rurais que praticavam a agropecuária e que atingiram pastos e alteraram rotas de manejos dos animais.

Paralelamente, os ativistas do bem-estar animal estariam gritando que o trânsito dos animais pelas ruas asfaltadas, sob o ruído da buzina dos automóveis e aplausos de uma população encantada com a quebra do tédio da rotina desgastante do dia a dia, provocaria o estresse dos animais. Ou seja, argumentariam que seria um típico caso de ataque ao bem-estar. Os demais participantes dos protestos contra a prática diriam que o acontecimento violaria os direitos dos cidadãos urbanos, porque aumentaria a disseminação dos gases de efeito estufa e seria um abuso contra os direitos dos animais.

Ora, vivemos em um país onde algumas autoridades, alguns políticos e a maioria dos cidadãos ignoram a história universal, a história pátria e as nossas tradições. Grande parte dos ativistas e colaboracionistas não ignoram, mas apenas fingem desconhecimento para ‘faturar algum’. Vamos a alguns exemplos, a começar pela enorme campanha contra os defensivos, promovida por alguns que desconhecem ou fingem desconhecer a história universal. Todos sabemos que a evolução do mundo se deveu a revolução a partir da introdução dos defensivos na agricultura, o que tem possibilitado a alimentação dos quase 8 bilhões de habitantes do planeta. Mesmo assim, eles insistem em demonizar os defensivos.

No caso da exportação de bovinos vivos, as campanhas contrárias à atividade transcendem o desconhecimento da nossa história e tradições, chegando às raias da hipocrisia. Explico: no Brasil, é uma atividade normal o envio de bovinos de um estado para outro para abate imediato ou recria e engorda. Esses animais são transportados de várias formas: caminhões, balsas, barcos e até mesmo a pé.

Há alguns anos, perguntei a um líder gaúcho contrário às exportações de bovinos vivos quantos ‘terneiros’ o Rio Grande do Sul havia enviado para São Paulo no ano anterior. De pronto, ele respondeu: “100 mil”. Afinal, qual a diferença do trânsito de animais entre os estados e entre países? O trânsito internacional dos animais é muito mais fiscalizado que o estadual e as regras de bem-estar são mais obedecidas.

Por isso, acho que seria muito bom se esses tais ativistas prestassem atenção à frase da escritora russa Ayn Rand: “Você pode ignorar a realidade, mas não pode ignorar as consequências de ignorar a realidade.”

 *Consultor em Agronegócio

 

 

 

 

AGROemDIA

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One thought on “Respeito à cultura rural

  • Helio Q. Jost

    Indios queimam pequenissimas areas. Não engane os leitores. As grandes queimadas são de gente ganaciosa e poderosa. O agro brasileiro é nocivo. Produz ricos, mas não riquesa.

    Resposta

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